sexta-feira, 4 de julho de 2014

MPF vai à Justiça contra emissoras de TV do Ceará acusadas de violar direitos



O Ministério Público Federal no Ceará (MPF-CE) ajuizou ação civil pública contra duas emissoras de televisão do estado, acusadas de exibir cenas impróprias e violar direitos. Fruto de mais de um ano de investigação, as ações voltam-se contra os chamados programas policiais veiculados pela TV Jangadeiro e pela TV Diário, que também teve conteúdos humorísticos apontados como irregulares pelo MPF. Em caso de descumprimento das sanções, o MPF pede que sejam canceladas as concessões de serviço de radiodifusão das emissoras.

Pela exibição de corpos esquartejados, ferimentos em destaque, imagens de adolescentes em situação de vulnerabilidade, entrevistas com pessoas detidas e sem julgamento, cenas de exploração sexual, agressão à honra, dentre outras, o MPF pede a condenação da TV Diário ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 1 milhão, e da TV Jangadeiro ao pagamento de R$ 500 mil. Valores que devem ser revertidos ao Fundo Municipal de Defesa da Criança e do Adolescente. As ações devem agora ser objeto de análise da Justiça Federal. As empresas podem recorrer.

O MPF considera que o "dano à coletividade" deve ser suspenso de imediato. Por isso, as ações pedem a concessão de tutela antecipatória para que os efeitos do julgamento sejam adiantados. O órgão argumentou que foram diagnosticadas: "a) ofensa à honra e à imagem de pessoas detidas – em situações de suspeita ou de flagrante, das vítimas e familiares (programas policiais); b) veiculação de programa de televisão em horário totalmente inadequado; c) exposição dos telespectadores, em sua maioria jovens e adolescentes, ao impróprio material exibido; d) ausência de classificação dos programas, pela União, em face da adequação de conteúdo nos horários exibidos" - nos termos da ação direcionada à TV Jangadeiro.

Ao avaliar o conteúdo dos programas Os Malas e a Lei, Nas Guarras da Patrulha, Show do Tony Nunes, João Inácio Show e Ênio Carlos Show, veiculados pela TV Diário, o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Alexandre Meireles Marques, responsável pela iniciativa judicial, afirma que "tais programas hoje são um incomparável show diurno de ilegalidades de banalização da violência". No texto, ele critica o fato desses programas policiais, como ocorre em diversos estados do país, serem exibidos entre as 12h e as 14h, tornando-os acessíveis a crianças e adolescentes de forma indiscriminada.

Os textos explicam que a permissão se dá porque a classificação indicativa na radiodifusão brasileira não é aplicada aos conteúdos jornalísticos ou noticiosos, bem como esportivos, eleitorais e anúncios publicitários. O MPF reforça, ainda, que o Ministério da Justiça, responsável pela classificação, deve fiscalizar o cumprimento do exposto na Portaria MJ 1.220/2007, que organiza o sistema de classificação, e reavaliar a situação.

Em entrevista à Agência Brasil, o procurador disse que a Justiça deve "sopesar" a dignidade da pessoa humana e a liberdade de imprensa, porque "a imprensa tem que respeitar os demais direitos que estão na Constituição”, como o direito à privacidade e à dignidade. Ele também explicou que esta não é a primeira vez que uma ação judicial é movida contra as emissoras, por causa desses programas. Outras ações já foram ajuizadas e, posteriormente, arquivadas. Lembrou que uma recomendação para que agentes das polícias Civil e Militar não permitam a filmagem e a entrevista com pessoas presas ou detidas, sem autorização, também não foi cumprida.

Além disso, Alexandre Meireles Marques relata que foram recebidas "várias representações de pessoas da comunidade cearense reclamando dos programas policiais e também de programas humorísticos produzidos pelas TVs Diário, Jangadeiro e Cidade". Esta não foi citada nas ações por ter assinado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), após audiência pública com o MPF e pressão da sociedade civil, que condenou a exibição de cenas de estupro de uma criança em um programa policial, no início do ano.

À época, uma nota assinada por mais de 70 entidades da sociedade civil pedia não só a retirada daquele conteúdo de circulação, bem como a responsabilização da TV Cidade e a "atuação dos ministérios públicos Estadual e Federal, de modo a garantir que os programas policiais veiculados no estado do Ceará respeitem a legislação protetiva de crianças e adolescentes".

Com a assinatura do termo, a TV Cidade se comprometeu a adequar a programação, sem ferir a dignidade do ser humano; não expondo pessoas em razão de cor, raça, deficiência, orientação sexual ou política; não veiculando imagens fechadas de cadáveres ou corpos mutilados; adotando cuidado especial com a veiculação de atos judiciais que envolvam crianças e adolescentes, bem como não identificá-los; não veiculando, salvo se possuir autorização expressa, imagens de pessoas envolvidas em atos ilícitos, dentre outros pontos.

O TAC estabelece ainda que a emissora fica sujeita a multa de R$ 70 mil por programa, em caso de descumprimento do acordo. No caso das ações ajuizadas agora, regras semelhantes para o conteúdo das emissoras, que usam concessão pública, são propostas.

A Agência Brasil procurou a TV Jangadeiro e a TV Diário, mas as duas emissoras não estão se pronunciando sobre o assunto.

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