quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Artigo: Vale Arte para todos

Historicamente as artes estiveram e estão reservadas a um seleto público e a espaços de consumo identificados com a população de maior poder aquisitivo. No modo de produção capitalista, a arte toma o caráter de mercadoria tornando-se um “fetiche” e, por isso, perde o seu viés de humanização, deixando o grande público a mercê da indústria cultural.

Essa problemática se repete em diversas localidades. O grande público é excluído do processo de pensar-fazer artístico e as manifestações artísticas e culturais efetivadas na periferia são discriminadas e excluídas do circuito da fruição das artes, bem como o acesso do que é produzido dentro do circuito da arte não chega à periferia criando uma espécie de dois mundos distintos. O mundo dos possuídos de grana e o mundo dos despossuídos. Isso não significa dizer que não existam relações e interações entre esses mundos. Logicamente as barreiras são invisíveis, mas ultrapassáveis e abundantemente perceptíveis.

As camadas populares são severamente eliminadas do processo fruitivo da arte, não é a toa que é tão presente o discurso de estranhamento e de auto-distanciamento da arte e da cultura por parte do grande público. Como se a produção cultural e artística fosse fruto da excepcionalidade, genialidade ou divindade e não resultado da produção especificamente humana.

De acordo com Canclini, “ (...) A arte nunca é tão fascinante, criativa e libertadora como quando atua de forma solidária com a capacidade produtiva e cognitiva do povo”. As comunidades periféricas convivem diariamente, com a inexistência de espaços e oportunidades de relacionar-se com a produção artística e cultural. Desconhecendo, muitas vezes, as manifestações e materiais produzidos em sua localidade e, por isso, vem a consumir produtos da embrutecedora indústria cultural. O grande público muitas vezes desconhece que a sua produção e reprodução da vida é fundamentalmente humana e por conseguinte cultural.

Existe um condicionamento ideológico que provoca a idéia nas massas de que a cultura é sempre uma produção restrita a alguns iluminados ou detentores do poder, alagando a distancia das camadas populares da sua própria vida.

A democratização/troca, reinvenção e interação do pensar e fazer artístico e cultural, tendo como foco a inclusão da população das comunidades periféricas , é um importante ingrediente para propiciar condições reais para que pessoas sem acesso ao circuito artístico/cultural possam refletir sobre o que produzem e consomem. Bem como, sejam capazes de se reconhecerem como possíveis criadores de uma arte libertária e humanizadora, fazendo frente à indústria cultural que notoriamente é um forte braço do mercado.

Baseando-se na perspectiva de que o processo criativo-fruitivo é algo histórico e socialmente construído, bem como pela compreensão da necessidade de ampliação do público fruidor das artes e da vida, a fim de permitir o desenvolvimento da autoconsciência como instrumento de emancipação humana, comungo com a professora Maria Inês Hamann Peixoto que afirma “pela proximidade de facilitação de acesso é também possível não só despertar, mas criar necessidades e prazeres especialmente humanos, tais como: acuidade perceptiva e agudeza da sensibilidade, o exercício da capacidade de reflexão, de interpretação e de crítica, entre outros, pois que a arte é criação-produto específico do homem e só a sua humanização deve se destinar”.

É imprescindível reconhecer também que o direito a diversidade, a interação, a reinvenção e a livre produção humana numa sociedade dividida em classes sociais antagônicas é uma falácia ou caso excepcional, particular. Esse direito é negado e não será dado pelo Estado representante das elites, mas pela e na imersão das lutas e resistências protagonizadas pela própria população, como vem ocorrendo nas infinitas realidades culturais e artísticas do povo Brasileiro que vem ponteando a sua história e contribuindo para o empoderamento dos movimentos sociais e ampliação das conquistas e a democratização das políticas públicas em nosso país.



Alexandre Lucas

Coordenador do Coletivo Camaradas, pedagogo e artista/educador

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