sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Dica: Conspiração Americana




UMA DICA DE BOM FILME:


O assassinato do presidente americano Abraham Lincoln é um fato importante e delicado da história dos Estados Unidos, por causa do acontecimento em si e pelo turbilhão de emoções envolvidas nele.

Conspiração Americana (The Conspirator, EUA, 2010) é um drama com aspectos históricos e jurídicos sobre as consequências do assassinato de Lincoln, e não serve exatamente como fonte de entretenimento, pois conta sua história num tom melancólico quase documental.



O filme é tenso, exagerado e bastante expositivo, especialmente no que se trata de mostrar o clássico embate ético entre justiça e vingança, representada aqui pela exigência da sociedade por um culpado quando um crime bárbaro acontece; quando um culpado real não é encontrado, normalmente encontra-se um bode expiatório. E nessa hora, a justiça dificilmente resiste à sede de vingança. Nem uma constituição decididamente criada para este fim resiste a um anseio tão primitivo que sempre desperta em momentos de desespero.

De ritmo bastante cadenciado e começo lento, Conspiração Americana demora a engrenar, mas à medida que os fatos se desenrolam, a apatia dá lugar a uma angústia crescente que fisga nossa atenção para o caso fatídico de Mary Surratt, mãe de um dos homens que conspirou para matar o presidente, acusada de cumplicidade no crime. E o desempenho meio passivo meio feroz da atriz Robin Wright é fundamental para isso.

Surratt é um personagem histórico importante no assassinato de Lincoln, tomada como foco para a trama do longa.

A história começa em um campo de batalha durante a Guerra Civil, onde, em meio à carnificina, o capitão Frederick Aiken (James McAvoy) se esforça para manter a vida do companheiro Nicholas Baker (Justin Long), que está gravemente ferido. Os dois homens sobrevivem à guerra, e alguns anos mais tarde Aiken aparece trabalhando como um advogado iniciante junto com Reverdy Johnson (Tom Wilkinson). Nicholas tornou-se seu amigo e parceiro em festejos noturnos. É num destes festejos que Aiken recebe a notícia de que o Presidente Lincoln foi baleado.

E aqui temos um dos primeiros motivos pra respeitar o filme — pelo menos, pra quem gosta da história dos Estados Unidos. O assassinato de Abraham Lincoln, que aconteceu dentro do Teatro Ford enquanto o presidente assistia a uma apresentação, é mostrado com certa distância, com um mistério respeitoso por um fato que realmente abalou a nação na época. Porém, o fato é recriado como apareceu segundo os relatos da época, inclusive o salto do assassino John Wilkes Booth (Toby Kebbell) para o palco após o crime, quando ele quebra a perna e sai gritando “Sic Semper tyrannis. O Sul está vingado!”.

Enquanto a nação chora — apresentado no filme de forma rápida através de closes comoventes e manchetes de jornais antigos —, Aiken descobre que seu chefe pretende assumir a tarefa inglória de defender Mary Surratt (Robin Wright), uma mulher viúva que dirigia uma pensão onde os conspiradores reuniram-se para tramar o assassinato. Para piorar as coisas, Surratt está sendo julgada por um tribunal militar especialmente convocado pelo General Hunter (Colm Meaney), que já a tem como culpada e está apenas conduzindo as regras para que ela seja acusada e usada como exemplo para a sociedade desejosa por alguém que pague pelo crime — veredicto determinado pelo Secretário de Guerra Edwin Stanton (Kevin Kline). Porém, Surratt está ali, na verdade, porque o governo não conseguiu capturar seu filho John Surratt (Johnny Simmons), que era amigo do assassino, ajudou na conspiração e fugiu para o Canadá, deixando a mãe em seu lugar para pagar por seus erros. Durante o julgamento, no entanto, Reverdy Johnson é afastado e Aiken acaba assumindo o caso de Mary, tomando para si toda a responsabilidade de defendê-la independente da mancha que isto possa trazer para sua reputação.

O veterano Robert Redford, que dirige o filme, traça paralelos entre seu enredo e as relevâncias ideológicas por trás de acontecimentos recentes dos Estados Unidos, sendo a mais óbvia a Guerra ao Terror do governo Bush. Mas apesar do aspecto ideológico, a grande relevância da produção é mesmo seu pano de fundo. Os fatos reais da história de Mary Surratt são MUITO interessantes. Quando o julgamento começa, é impossível não devotar o mínimo que seja de atenção à árdua luta para que Mary seja julgada por um júri civil ao invés de militar. E o esforço de Aiken, interpretado com paixão por James McAvoy, é inspirador. E até certo ponto frustrante — de uma forma boa. É meio triste ver um herói de guerra, que deu tudo de si numa batalha horrenda pelos direitos civis para sua nação, ter que dar mais ainda de si para fazer com que esses direitos sejam respeitados. É como se sua luta anterior não tivesse validade. Algo que mostra como os feitos positivos, por mais reconhecidos que possam ser, quase sempre acabam esquecidos em momento de crise. Um ser humano dificilmente consegue lembrar o que é ser humano quando sente medo e incerteza. E estes sentimentos assolaram o povo americano naquela época de guerra e com a morte de sua presidente.

A direção e a condução do roteiro de Redford são consistentes e, depois que ganha ritmo, a história funciona. Mas, para os conhecedores do período de Guerra Civil Americana, a forma como alguns fatos são explorados pode parecer limitada — por exemplo, o personagem Lewis Payne (Norman Reedus, o Daryl da série The Walking Dead) recebe um tratamento bastante superficial aqui, e na época do assassinato foi um dos conspiradores que mais recebeu atenção junto com Booth e Surratt. De qualquer forma, é só um detalhe, não chega a atrapalhar, já que a intenção do filme é mesmo focar no drama de Mary Surratt e Frederick Aiken. E nessa intenção, Conspiração Americana se destaca com louvor.

FONTE: www.nivelepico.com

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