domingo, 18 de setembro de 2016

Crise dos Estados chega após 10 anos de 'bonança'

Seguindo o exemplo do Rio de Janeiro, governadores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste ameaçam decretar calamidade pública, a partir desta semana, se a União não lhes conceder uma ajuda de R$ 7 bilhões. Minas Gerais esboçou a mesma intenção e o Rio Grande do Sul segue parcelando pagamentos. Para os especialistas em finanças públicas, a situação pré-falimentar dos Estados comprova que eles não apenas demandam ajuda emergencial para sobreviver à recessão: precisam de uma reestruturação urgente e profunda. 'Não mendigamos. Queremos o que é nosso', diz governador do Piauí

O paradoxo é que a crise chega após um longo período de bonança. Nos últimos dez anos, os governos estaduais viveram uma espécie de "boom" das receitas. De 2004 a 2015, a arrecadação cresceu, em média, 41% acima da inflação - o que significou uma receita extra de R$ 170 bilhões, segundo estudo realizado pela consultoria Macroplan. Ocorre que as despesas avançaram mais: 50% acima da inflação. E o endividamento foi além: após um período sob controle, disparou e fechou 2015 em R$ 653 bilhões. "Os Estados desperdiçaram a década," diz Gustavo Morelli, diretor da Macroplan.

Esse "desperdício" pode ser medido nos indicadores de prestação de serviços públicos do estudo, que mostram como a qualidade avançou pouco em relação aos recursos disponíveis ou, em vários casos, estagnou e até retrocedeu. Na área da saúde apenas quatro Estados tiveram melhoras expressivas. Na educação, todos tiveram pequenos avanços, mas 17 regrediram na nota do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Na segurança, 21 pioraram e quem melhorou foi bem pouco.

Pelo estudo, por exemplo, é possível saber que Sergipe investe por aluno quase o mesmo que São Paulo, mas a sua nota no Ideb foi caindo. Na década, Alagoas praticamente dobrou os investimentos em segurança, mas dobrou também a sua taxa de homicídios e hoje é o Estado mais violento do País. Numa demonstração de que gestão é tão ou mais importante que dinheiro, o Ceará, com baixos investimentos na reformulação do atendimento, reduziu pela metade a taxa de mortalidade infantil.

A Macroplan cruzou informações de 28 indicadores, como déficit habitacional, taxa de desemprego, cobertura de saneamento, índice de transparência e até o trâmite de processos judiciais dos 27 Estados e Distrito Federal. A conclusão: "Pela quantidade de recursos disponíveis, os Estados tiveram melhorias muito heterogêneas e, em muitos casos, abaixo do esperado - precisam de uma agenda de reformas para avançarem", diz Morelli. Essas reformas se tornam mais urgentes, avalia ele, porque, daqui para frente, o cenário é de restrição. A retomada do crescimento tende a ser mais lenta e o ajuste fiscal, com corte de gastos, inexorável: "Sem reformas, os Estados terão uma verdadeira década perdida daqui para frente", diz.

- no Jornal O Povo

Nenhum comentário: