Um país com suas continhas orçamentárias bem ajustadas, dívida em extinção — e, pior do que estagnado, de volta aos níveis imorais de miséria, pobreza, desordem, ensino em retrocesso constante, saúde pública em coma terminal, indústria nacional desmantelada, desemprego e violência urbana.
É o que se pode vislumbrar para os anos vindouros, se efetivadas as medidas que Henrique Meirelles e Michel Temer apresentaram –com o devido cuidado da imprensa para maquiar umas e encobrir outras– como pacote primordial da aventura que iniciam.
A medida central, que consiste em estabelecer um teto permanente para os gastos do governo, só aumentado na proporção da inflação anual anterior, traz para o país uma perspectiva fácil de se presumir.
Mesmo Dilma Rousseff reconhece, entrevistada para a revista Carta Capital, o desastre econômico que foi 2015.
Tudo no Brasil se deteriorou com intensidade assombrosa. A desgraceira que cresce, a ponto de atingir o olimpo das empresas financeiras, é apenas a continuidade de 2015 (por favor, nada de dizer “o ano que não acabou”).
Os serviços públicos estão em pandarecos, os investimentos desabaram, as universidades desmilinguem, tudo é assim.
Apesar disso, o gasto contabilizado do governo no ano passado foi de R$ 1,16 trilhão.
A esse montante, um exercício de Gustavo Patu, na Folha desta quarta-feira (25), aplicou as medidas propostas por Meirelles sob o olhar um tanto vago de Temer.
Constatação: o 2015 de Meirelles teria os seus gastos limitados a R$ 600,7 bilhões. Metade, pode-se dizer, do gasto realizado.
Por mais que tenha havido desperdício de dinheiro público naquele trilhão, não há como evitar a conclusão de que a brutalidade do corte proposto para a nova política econômica só pode trazer ao país a degradação da degradação.
Se com um trilhão o país está em estado deplorável, com gastos pela metade pode-se imaginar como estará.
Ou melhor, nem estará. O crescimento econômico depende do investimento estatal que o inicie e o estimule.
A iniciativa privada no Brasil (e não somente no Brasil) é privada mas não iniciativa.
Meirelles não se ocupou dos investimentos, na apresentação inicial do plano, porque nem era necessário: o teto do Orçamento, corrigido só pela inflação, já indica a exiguidade de investimento em proporções mobilizadoras e de interesse por tê-lo.
Por falar em nisso, Michel Temer comparou-se de raspão a Juscelino. Mas quem Temer faz lembrar é Collor com a combinação de loucuras e violência que aplicou como plano econômico.
Não é inovadora, portanto, a complacência quase envergonhada com que a imprensa se faz colaboradora de Temer, como preço –autêntica liquidação de outono – de não ter o PT no governo nem o risco de Lula em 2018.
Depois, lava-se a história, com ou sem jato.
Mas o malabarismo praticado por muitos comentaristas oferece um lado cômico nessa história de salvar o salvador perdido.
Do cômico ao trágico: o corte proposto contra a educação é também contra os jovens de hoje e as próximas gerações de estudantes; o corte proposto contra a saúde é também contra as gestantes, as crianças e todos os carentes.
Ambos são agressões ao espírito da Constituição e suas intenções de reparação social da nossa história de injustiças e perversidades.
A educação tem hoje, por garantia constitucional, ao menos 18% do arrecadado com impostos. A saúde tem garantia semelhante, em menor percentual.
O plano Meirelles retira da educação e da saúde essa garantia de um mínimo que leve a ampliar e estender a educação, como se deu nas últimas décadas, e atenuar os problemas persistentes na saúde pública.
Os valores ficarão congelados, com futuros acréscimos correspondentes apenas à fictícia correção pela inflação.
Note-se que o ponto de partida, nesse congelamento, é o percentual deste ano de baixa arrecadação.
Logo, educação e saúde já começam com perda substanciosa.
Contas certinhas (no diminutivo, sim, porque serão cada vez menores), que beleza.
Para um futuro condenado sobre um presente caótico.
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