Motivos reais não faltam para carregar bandeiras, ou melhor, para se
engajar em hashtags no mundo virtual: os milhões de reais investidos
em uma Copa do Mundo no Brasil, os números e as razões absurdas de
estupros femininos, o desmatamento de centenas de árvores para o
progresso seguir, o caso de racismo sofrido pelo jogador Daniel Alves no
jogo do Barcelona contra o Villarreal (no dia 27 de abril deste ano) -
para citar fatos dos últimos meses e que, entre fotografias de
felicidades e pensamentos soltos, ainda são compartilhados na timeline.
O ativismo virtual tem ganhado, cada vez mais, hashtags
e gerado debates do Twitter ao Facebook, passando pelo Instagram. Mas,
considerando a natureza instantânea desses canais de informação, até
que ponto #somostodosativistas? “Não, necessariamente, todas as pessoas
que aderem àquela manifestação têm um pensamento formado sobre
aquilo”, avalia Cassio Politi, diretor de content marketing da Tracto e
autor do livro Content Marketing - o Conteúdo que Gera Resultados
(Bookess, 2013).
Politi, que atua na área de conteúdo
online desde 1998, reconhece que as manifestações em redes sociais são
“espontâneas, legítimas” - a exemplo de #SomosTodosMacacos. “A
sociedade brasileira não tolera mais o racismo”, diz. Mas ressalva que
“nem todo mundo que está usando aquela hashtag sairia para a rua... As
pessoas não são ativistas daquele assunto e acabam se influenciando por
esse viral que surge”.
SuperficialidadeNa
análise do professor Tadeu Feitosa, chefe do Departamento de Ciência da
Informação da Universidade Federal do Ceará (UFC), os ativismos que se
resumem às hashtags “são ativismos-prótese. Não aludem às questões
básicas das causas que reclamam esse ativismo. Se comportam como
prótese: algo que está no lugar da coisa temporariamente, nasce efêmera
e permanece efêmera”.
Para o professor de Cultura e
Mídia, na timeline ou em 140 caracteres, “há um posicionamento rasteiro
de fenômenos (sociais) que são complexos”. A propósito, sobre o
protesto virtual contra o racismo, movido a bananas, ele opina ser
“ridículo e preocupante. Porque está reduzindo o fenômeno do racismo a
macaquices e bananadas. Não se consubstancia em luta, mas no racismo
permitido, travestido de um ativismo (superficial)”.
Tadeu
Feitosa prefere falar em “mídia social” ao invés de redes sociais -
“que são estabelecidas milenarmente” -, para dizer ainda sobre a falta
de profundidade do ativismo virtual. “Nas mídias sociais, só
interagimos com nossos grupos”, conclui.
“É impossível
generalizar. Tem gente que compartilha e vira blogueiro de uma única
causa, pode-se começar a virar ativista. Vai ter gente que vai
compartilhar e ‘retuitar ‘por simpatia, porque gosta de alguém envolvido
naquela campanha. E vai ter o ativista eventual”, dialoga Jamil
Marques, doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas e membro do
Conselho Consultivo de Leitores do O POVO. “É um fenômeno natural e são
reivindicações que vão se mostrando. E a gente vai ter que aprender a
conviver com isso que não é, necessariamente, ruim”, equilibra.
SAIBA MAIS
Um
torcedor do Villarreal joga uma banana para Daniel Alves, quando o
lateral direito do Barcelona vai cobrar um escanteio. O jogador
brasileiro come a fruta e passa a bola de uma campanha contra o racismo
para Neymar, que também já sofreu preconceito semelhante no futebol
europeu.
O atacante do Barcelona publica, no Facebook, uma foto
com o filho, segurando uma banana e criando a hashtag
#somostodosmacacos. A ação de Daniel Alves foi espontânea, mas a
campanha iniciada por Neymar é ideia da agência de publicidade Loducca -
que esperava uma oportunidade para lançá-la. Na carona dos protestos
virtuais, o apresentador Luciano Huck criou camisas com a frase,
vendidas a R$ 69.
Jornal O Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário