segunda-feira, 13 de abril de 2015

Uma avaliação das manifestações de 12 de abril

Do jornalista Paulo Moreira Leite:

Em comparação com os protestos de 15 de março, as manifestações de ontem foram menores pelo volume e pela geografia. Em várias cidades, os protestos foram cancelados ou nem foram convocados. Em São Paulo, o mesmo DataFolha que apontou 200 000 pessoas nas ruas, há um mês, calcula que ontem o protesto envolveu 100 000. Em outras cidades, onde cálculos mais precisos foram substituídas por estimativas e puros chutes, as reduções também foram notáveis.
O mesmo ocorreu nas redes sociais, informa a consultoria Bites. Se as manifestações geraram 1,3 milhão de mensagens há um mês, esse número ficou em 259 000, ontem — uma redução de 81%. O uso da palavra impeachment nas mensagens caiu 86% e a palavra corrupção, 85%. Isso quer dizer que a melodia agressiva que dominou as redes sociais em março, já não era ouvida ontem.
Uma queda dessa dimensão no prazo de apenas um mês, quando nenhum milagre visível se materializou na conjuntura, possui vários significados.
O primeiro é ensinar que a oposição não foi capaz de transformar o impeachment numa causa realmente popular. Se a massa que foi a rua em março expressava o descontentamento dos adversários do governo, as mesmas pessoas foram a rua em abril — mas a metade nem saiu de casa. Se março deu a muitos analistas a impressão até de que a sobrevivência governo poderia ser colocada em questão, o 12 de abril retratou um protesto outra natureza, ainda que isso não deva inspirar festejos exagerados por parte deste governo.
Afinal, só em São Paulo foram 100 000 pessoas na rua. Mesmo que se possa duvidar da estimativa de que 25 000 pessoas foram à Esplanada, em Brasília, e também em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, seria bobagem negar que em diversos lugares ocorreram manifestações significativas.
Mas a verdade é que ninguém convoca um segundo protesto imaginando que ele será menor do que o primeiro.
Essa queda na participação aconteceu apesar do engajamento conitínuo dos grandes meios de comunicação. Mais uma vez, tentaram dar às manifestações um caráter dramático e decisivo, um evento ao qual o cidadão comum deveria comparecer por razões cívicas — e não políticas. O apelo à presença de crianças se explica por isso — mas nem de longe surtiu o efeito esperado. Não custa lembrar que nas semanas anteriores os meios de comunicação fizeram várias reportagens em estilo glamouroso com os organizadores dos protestos. Omitindo cuidadosamente o caráter anti-democrático e fascista de boa parte de seus movimentos, eles eram tratados como jovens celebridades de um novo tempo, uma espécie de simpáticos roqueiros convertidos a anti-PT. No próprio domingo, a cobertura mostrava cenas de cada cidade, logo cedo, num esforço de cobertura típico de eleição presidencial, Copa do Mundo e eventos desse tipo. Era para deixar o cidadão sentindo-se culpado se decidisse não comparecer. O resultado ficou a vista de todos.
Isso aconteceu, em minha opinião, porque o ocorreu uma mudança no debate político das últimas semanas.
Para começar, foi possível demonstrar, a partir das redes sociais, o caráter golpista de boa parte das manifestações contra o governo. Isso provocou uma justa retração por parte do eleitorado de espírito democrático, que não apoia Dilma por nenhum motivo — mas não aceita mudar o governo fora das regras estabelecidas pela Constituição. O receio de serem abandonados por esses eleitores levou lideranças que antes disputavam o primeiro lugar dos protestos a tomar distância — algumas nem apareceram nas manifestações de ontem.
Há um desgaste de outra natureza, também. A presença de estrelas do PSDB na lista de investigados da Lava Jato, mesmo divulgada de forma seletiva e parcimoniosa, teve seus efeitos junto a seu eleitorado.
Tratado como uma espécie de herói anti-petista pela conquista da presidência da Câmara de Deputados, Eduardo Cunha passou as últimas semanas pagando a conta eleitoral da agenda conservadora que impôs ao Congresso. A redução da maioridade penal é rejeitada por grandes parcelas da população, em particular aqueles que podem transformar-se em suas vítimas preferenciais — jovens pobres e negros. Eduardo Cunha, o PMDB e o PSDB fizeram questão de voltar, 72 horas antes do dia do protesto, o projeto de lei 4330, que revoga a CLT, principal conquista histórica dos trabalhadores brasileiros.
Se havia interesse em engrossar as manifestações para encurralar o governo, não poderia haver uma ideia mais contraproducente, vamos combinar.
Outro aspecto envolve a economia. O ajuste continua sendo motivo de descontentamento do eleitorado que arregaçou as mangas para garantir a vitória de Dilma no segundo turno. E pode é produzir novos descontentamentos no futuro, quando os efeitos do juro alto e do cortes nos gastos públicos ajudarem a enfriar a economia de verdade. Mas as medidas de Joaquim Levy começam a obter a aprovação real de uma parte dos adversários do governo, o que talvez não transforme os inimigos em aliados, mas contribui para diminuir o ambiente de histeria.

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